quarta-feira, 24 de agosto de 2016

Antes que o pecado neoliberal nos atinja

Ponho aqui um breve comentário sobre a excelente análise em torno dos termos em que se dá hoje a discussão a respeito da crise econômica brasileira (Para subverter nosso debate econômico rasteiro, de Felipe Calabrez, via Outras Palavras). Para o autor, o ponto central em discussão não é propriamente o tamanho da reforma fiscal ou as medidas para que o crescimento econômico seja retomado pelo caminho do estímulo aos investimentos. O núcleo disso que o texto chama de "debate rasteiro" é o perfil do projeto político neoconservador que está por trás da racionalidade das reformas: a ampliação da apropriação privada da riqueza nacional - alguma coisa sobre a qual os brasileiros sabem muito pouco e que sequer esteve em discussão nas últimas eleições. É essa a essência do golpe.

Nem é preciso ir muito longe para a comprovação disso. Uma rápida leitura sobre o conteúdo da Ementa Constitucional 241 - que quer limitar o ajuste das despesas sociais do orçamento da União ao índice da inflação - permite entender que o que está sendo tramado é o congelamento, por duas décadas, dos compromissos do Estado com a sociedade. Pessoalmente, minha interpretação sobre esse crime que a quadrilha de Temer vai praticar é de que se trata de um sequestro antecipado do produto social do trabalho. Acrescente-se a isso o inevitável agravamento da concentração da renda provocada pela flexibilização das leis trabalhistas e pela reforma da previdência social e o horizonte surge como fúria, ou, como quer Calabrez, "o maior retrocesso da história da Nova República". Arrisco ir mais longe: dada a dimensão do PIB brasileiro em padrões comparativos globais, penso que vamos assistir a um retrocesso sem similar desde a Revolução Industrial do século XVIII.

No entanto, há na sociedade brasileira uma construção simbólica legitimando tudo isso pelo caminho do discurso midiático; um conjunto de categorias marcadas por seu sentido reacionário e de repúdio à ideia de qualquer reconhecimento da alteridade como instrumento de sociabilidade. Um antagonismo de essência ideológica fabricado deliberadamente pela mídia e pelas elites que ela representa. Sei não... sociedades que testaram experiências semelhantes a essa, tipo a Espanha de Franco, Portugal de Salazar, a Alemanha nazista, o Chile de Pinochet, a Hungria pós-socialista enfrentaram convulsões civis graves, como lembrou Roberto Requião no texto republicado na revista Fórum lincado acima. Os senadores com a palavra...

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