segunda-feira, 16 de maio de 2016

A questão feminina sob o olhar reacionário de Temer

A dificuldade da gangue de Temer - e dele próprio - é encarar a diversidade social e cultural do país; conviver com o complexo, admitir as disparidades e reconhecer todos os padrões de emancipação que coexistem no mundo contemporâneo. A discriminação das mulheres nesse "governo" - e não só delas - é o resultado dessa forma obscura de existência. Tomara que isso termine logo...

Até agora, passados 10 dias desde que chegou ilegal e ilegitimamente à Presidência da República, a única marca que Temer conquista é o seu isolamento avassalador. Em todos as áreas para onde quer que se olhe, suas iniciativas estão sendo travadas por disputas, incompetência, exibicionismo e, acima de tudo, uma extraordinária ausência de senso de ridículo. Alguém leva a sério a encenação de Serra no Itamaraty, de Meirelles na Fazenda, de Jucá sabe-se lá aonde, do fascistão que assumiu a pasta de Justiça? O resultado é essa perambulação humilhante (sempre desconfortável e sem jeito) de Temer pelas fotos, pelas reuniões, pelos microfones, em busca de alguma lógica para a enrascada em que se meteu. Na sua solidão, deve estar torcendo para que sua via crucis não vá além dos 180 dias porque ninguém gosta dele, ninguém confia nele. 

O caso mais curioso é o da dificuldade que o interino da Presidência da República enfrenta com as mulheres. Por uma dessas manifestações tardias de um puro e atrasado preconceito de gênero, nenhuma mulher foi indicada (sequer convidada) para ocupar qualquer posto no seu "governo". Flagrado, o staff golpista, pela voz de Jucá, disfarçou ao dizer que se não há mulheres no governo a culpa é dos partidos que não as indicaram. Pode até ser pois que são todos farinha do mesmo saco. Mas um pouco mais sincero, o próprio Temer desmentiu a hipótese e ordenou à gangue que buscasse sanar a gafe colocando "alguma" em algum escalão inferior (leia aqui).

Eis aí em toda sua nudez a estupidez de Temer. O prêmio de consolação para as mulheres não vem do reconhecimento da força da sua identidade, mas da admissão de que não houve convite porque é do reacionarismo dessa turma que o primeiro escalão, por não ser inferior, não terá titulares "inferiores", pois é assim que Temer e sua facção veem as mulheres. Essa linha de análise fica reforçada agora com a determinação de que a Secretaria da Cultura (um departamento "inferiorizado" ao deixar de ser ministério) deve ter uma mulher como titular. São duas faces de um mesmo conceito: é inferior a atividade cultural porque nem ministério merece ser; é inferior a mulher que responderá por ela.

No final das contas, o ambiente sórdido e pesado que se respira hoje nas salas frequentadas pela chusma de Temer reflete um pouco o seu chefe: sedoso, meloso, esticadíssimo na glostora, certamente dançarino exímio de boleros, mas cospe na rua, palita os dentes em público, disfarça sem sucesso a asia e o mal-estar e nutre um gigantesco preconceito por todas as formas de vida que não sejam aquelas que se circunscrevem à insignificância de suas próprias vidas. Se não tirarmos essa turma de lá agora mesmo, vamos sofrer muito porque a resposta para esse desconforto em que ela circula é sempre perversa e perigosa...

Ps: este post já estava circulando quando saiu a notícia de que Temer indicou uma economista para chefiar o BNDES (leia aqui). Sob qualquer ponto de vista, é mais um desastre que o interino comete: associar a representação feminina no governo à política de privatizações - como se essa fosse a perspectiva de sua presença no governo. Além disso, o nome foi sugerido por Paulo Skaf, o golpista que é presidente a Fiesp. Como disse alguém, diga-me com quem andas...

Leia mais: * Michel Temer fracassou na estreia (Le Monde) * Senadores brasileiros denunciam golpe em encontro de parlamentares da Europa e da América Latina (Opera Mundi) * Barulhaço contra Temer bombou na noite de domingo (Midia Ninja) * Temer e a Casa Grande se iludem (Eliane Brum, El País) * Busca-se (rapidamente) uma representante do "mundo feminino" para a Cultura (Camila Moraes, El País) * Ministério de Temer desencoraja mulheres e minorias na política, diz pesquisadora canadense (Opera Mundi) * Moradores de rua contra Temer (Midia Ninja).
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